Audiência pública debate sugestões da magistratura e da academia para a atualização do Código Civil

Audiência pública debate sugestões da magistratura e da academia para a atualização do Código Civil

A comissão de juristas criada pelo Senado para elaborar a proposta de revisão do Código Civil (Lei 10.406/2002) se reuniu nesta segunda-feira (23), na sede da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em São Paulo, para debater, em audiência pública, as sugestões recebidas de profissionais do meio jurídico da Região Sudeste.

O evento foi conduzido pelo ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Luis Felipe Salomão, presidente da comissão. Participando por videoconferência, o ministro Marco Aurélio Bellizze, vice-presidente da comissão, parabenizou a mobilização da comunidade jurídica em torno da atualização do código. "É uma obra realizada por muitas mãos, com extrema ##competência##", declarou.

Nestor Duarte, professor titular de direito civil da Universidade de São Paulo (USP), afirmou que a parte geral do código não demandará grandes modificações, apenas alguns acréscimos em virtude de novidades previstas na parte especial. Ele sugeriu sanar omissões relacionadas ao reconhecimento da união estável como entidade familiar e mudanças na aplicação de prazos prescricionais e decadenciais.

A professora de direito civil Cíntia Rosa Pereira, da Faculdade de Direito da USP em Ribeirão Preto, falou sobre a dificuldade de estabelecer requisitos para elencar um rol taxativo de direitos de personalidade em ambiente digital, considerando o contexto de proteção de dados. Ela mencionou, como exemplos, os direitos ao esquecimento, à desindexação e à desvinculação, e propôs uma reflexão a respeito da tutela dos direitos de personalidade da pessoa física após a morte e dos relacionados a pessoas jurídicas.

Juliana Abrusio, professora de direito digital da Universidade Mackenzie, declarou que essa área do direito perpassa os demais ramos, devendo ser considerada transversal, mas apontou alguns aspectos jurídicos preponderantes nesse contexto – entre eles, informalidade dos atos jurídicos, contratos de desenvolvimento de tecnologia e prestação de serviços de tecnologia, gig economy e documentos eletrônicos.

Desjudicialização na esfera civil

Ao falar sobre o direito das obrigações, José Roberto de Castro Neves, professor de direito civil da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), sugeriu intensificar o processo de desjudicialização na esfera civil, incluindo a autocomposição como forma de resolução de conflitos.

O estabelecimento de parâmetros de indenização para responsabilização civil extracontratual foi um dos temas abordados por Silvio de Salvo Venosa, professor e desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP). Ele vê a necessidade de acertos pontuais no tema, para que não haja margem a punições na responsabilidade civil. "A economia brasileira não está preparada para punitive damages", declarou.

Maurício Bunazar, professor do Programa de Mestrado da Escola Paulista de Direito, propôs alterações em contratos em espécie, especificamente nos de compra e venda, de prestação de serviço e de doação, escolhidos por serem considerados modelos para elaboração de outros tipos de contratos.    

Francisco Eduardo Loureiro, desembargador do TJSP, apresentou alguns pontos do código relacionados ao direito das coisas que mais geram demandas ao Poder Judiciário. Mencionou a possibilidade de aprimorar artigos relacionados ao direito de posse, de suprir lacunas relacionadas ao direito de condomínio e de regular o direito real de aquisição do compromisso de compra e venda.

Juliana Krueger Pela, professora da Faculdade de Direito da USP, ao discutir o direito de empresa, apontou as dificuldades interpretativas para a definição do conceito de empresário e propôs a unificação no tratamento dado às atividades econômicas voltadas ao mercado. A professora também tratou do regime de responsabilização societária nas sociedades limitadas e da possibilidade de afastamento da aplicação das regras das sociedades simples.

Um código voltado para a sociedade

Sobre direito de família e reprodução assistida, Ana Cláudia Silva Scalquette, professora de direito civil da Universidade Mackenzie, abordou a necessidade de regulamentação da filiação decorrente da reprodução humana assistida e temas relacionados, como sigilo de doadores, direito à ascendência, cessão de útero e filiação post mortem.

Destacando que o Código Civil é uma lei voltada para a sociedade, João Ricardo Brandão Aguirre, professor de direito civil da Universidade Mackenzie, indicou a necessidade de se adequar o direito sucessório de companheiros e cônjuges, inclusive em uniões homoafetivas, além de atualizar os meios de disposição de última vontade testamentária. Para João Aguirre, questões relacionadas a direito sucessório devem estar pautadas pela tutela de pessoas vulneráveis, levando em consideração questões de gênero e acessibilidade.

Ana Luiza Maia Nevares, professora da pós-graduação da PUC-RJ e diretora acadêmica do Instituto de Direito de Família (IBDFAM), fez uma interseção entre o direito de família e o direito de sucessões. A professora explicou que as novas configurações familiares conferiram ainda mais relevância ao direito sucessório, principalmente no que diz respeito ao direito real de habitação. Para a professora, é necessário considerar o contexto familiar que precede a sucessão hereditária, observando as vulnerabilidades.

Ao fim das exposições, a mesa – nesse momento presidida pela ministra Isabel Gallotti – abriu espaço a perguntas. A íntegra dos debates pode ser vista no canal do Senado no YouTube.

Comissão fará mais duas audiências públicas em 2023

Presidida pelo ministro Luis Felipe Salomão, a comissão de 31 membros conta com a participação da ministra Isabel Gallotti e dos ministros João Otávio de Noronha, Marco Buzzi e Marco Aurélio Bellizze, todos do STJ, além do ministro aposentado Cesar Asfor Rocha. Os relatores são a desembargadora aposentada Rosa Maria de Andrade Nery e Flávio Tartuce, ambos professores de direito civil.

A próxima audiência pública está marcada para 20 de novembro, às 14h, no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), em Porto Alegre. A última audiência do ano ocorrerá no dia 7 de dezembro, às 14h, em Salvador, no auditório do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA). Todas serão transmitidas ao vivo pela TV Senado e pelo canal do Senado no YouTube.

A página da comissão no portal do Senado tem informações sobre audiências públicas, pautas das reuniões futuras, reuniões já realizadas (com notas taquigráficas, vídeos e atas), plano de trabalho, regulamento e outros documentos.

Veja as fotos da audiência pública em São Paulo.

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